O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou audiência nesta quarta-feira (17) para ouvir os argumentos das partes envolvidas no processo sobre a legalidade da legislação que estabeleceu critérios para a realização de cirurgias de esterilização voluntária, popularmente conhecidas como vasectomia e laqueadura.
Os ministros escutaram representantes de várias organizações que defendem os direitos das mulheres e também da defensoria pública antes de emitirem seus votos. A data para o julgamento final ainda está pendente.
A Suprema Corte vai examinar partes da Lei 9.263/1996, também chamada de Lei do Planejamento Familiar, com base em uma ação movida pelo PSB em 2018. Na prática, as restrições afetam principalmente as mulheres.
O texto original determinava que homens e mulheres só poderiam realizar laqueadura e vasectomia se tivessem no mínimo 25 anos, pelo menos dois filhos vivos, e após esperar um intervalo mínimo de 60 dias.
Durante esse tempo, conforme estipulado pela lei, homens e mulheres deveriam ter acesso a aconselhamento para "desencorajar a esterilização precoce". Além disso, a norma estabelecia que a esterilização dependia do consentimento expresso do cônjuge.
Em 2022, a Lei 14.443 modificou alguns aspectos da legislação original sobre o assunto. A exigência do consentimento para a laqueadura foi revogada e a idade mínima foi reduzida para 21 anos. No entanto, a restrição quanto ao número mínimo de filhos permaneceu.
Durante as argumentações, a advogada Ana Letícia Rodrigues, representante do PSB, argumentou que as restrições violam os direitos reprodutivos e constituem uma interferência indevida do Estado no planejamento familiar dos cidadãos brasileiros.
"Eis uma intervenção estatal inaceitável, que condiciona o exercício de um direito a uma finalidade específica do corpo e da sexualidade, ou seja, a concepção de filhos, reforçando uma cultura de maternidade compulsória e dificultando o acesso a métodos contraceptivos eficazes", afirmou.
A advogada Ligia Ziggiotti, do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), argumentou que a autonomia das mulheres deve ser respeitada e a esterilização voluntária deve ser permitida para mulheres com mais de 18 anos. Para Ligia, o Estado não deve impor requisitos adicionais de maturidade ou número de filhos para a realização da laqueadura.
"Um Estado democrático de direito não pode restringir o exercício da liberdade, partindo do pressuposto de que a decisão de uma mulher adulta e consciente que não deseja engravidar é uma escolha questionável", afirmou.
Segundo a defensora pública Tatiana Mello Aragão, representante da Defensoria Pública da União (DPU), apenas a idade mínima de 18 anos deveria ser exigida para impedir a esterilização voluntária.
"Embora a legislação se aplique a ambos os sexos, as mulheres enfrentam essa situação de forma muito mais acentuada. Historicamente, elas têm a responsabilidade de evitar a gravidez, tanto que a laqueadura é muito mais comum no Brasil do que a vasectomia", acrescentou.
O novo procedimento de ouvir as partes antes do julgamento foi adotado no ano anterior pelo presidente do STF, Luís Roberto Barroso, seguindo o modelo da Suprema Corte dos Estados Unidos.